O que era uma pauta de entidades ambientalistas autônomas e de alguns pesquisadores tornou-se, especialmente desde o início da década de 1990, um movimento multissetorial e complexo, interinstitucional, com uma crescente carga de trabalho, já que a insustentabilidade é crescente no sistema industrial capitalista. A degradação ambiental do planeta é ampla, acelerada, sistêmica, enquanto a lógica linear de produção-circulação-descarte é dominante no sistema capitalista, assim como em países ditos socialistas ou comunistas. Os regimes políticos via de regra têm o analfabetismo ecológico como uma característica central.
O fato é que o ambientalismo multissetorial ganhou adeptos enquanto se disseminou na sociedade mas, simultaneamente, perdeu foco e noção de prioridades nas suas lutas e campanhas. Tanto empresários quanto partidos políticos aderiram ao discurso ambientalista genérico, esvaziando com isso a gravidade dos problemas ambientais diante da maioria da população. Diversas leis de proteção ambiental ficam apenas no papel, não são implementadas.
Após décadas de política ambiental com uma pauta em crescente complexidade, por pressão tanto da sociedade civil local, nacional, quanto internacional, o atual governo brasileiro adota uma política de desmonte da agenda ambiental e esvaziamento do próprio ministério do meio ambiente, a cargo de um político assumidamente de direita como é Ricardo Salles.
Sob pretexto de combater as bandeiras de esquerda, o governo promove grande confusão ideológica. Confunde ecologismo com marxismo cultural. O guru Olavo de Carvalho é um notável analfabeto ecológico, como também é o caso da maioria dos governantes brasileiros. Isso é compreensível na medida em que a ecologia é uma ciência atípica, que estabelece relações interdisciplinares desde o seu surgimento no século 19, corroendo as ideologias políticas de direita e de esquerda, assim como as de centro.
O Brasil é uma nação que surgiu a partir da colonização predatória -- até o nome "Brasil" é oriundo de um projeto de destruição de riquezas ( árvore Pau-Brasil ).
Esse país tropical e subtropical é megadiverso e hipercomplexo na sua realidade sociambiental. Não é estranho, por isso, que governos oportunistas, populistas, de esquerda e de direita, façam grandes estragos, grandes simplificações e confusões.
Portanto, é hora de eleger prioridades na luta ambiental. A defesa da Amazônia e a luta contra a isenção de impostos aos empresários de agrotóxicos, bem como uma reavaliação científica da liberação de um número recorde de venenos, parecem ser as prioridades do momento histórico.
Com efeito, se em 2018, último ano do governo Temer, foram registrados os mais elevados números do desmatamento ilegal da Amazônia em toda a história, com a perda de 52 hectares de florestas por dia, em 2019, nos primeiros 15 dias do mês de maio do governo Bolsonaro o desmatamento chegou ao absurdo número de 19 hectares de florestas perdidas por hora, em média -- o que representa o dobro do mesmo período do ano anterior. O dobro do máximo na história! E o que é mais significativo é que este dado se refere a florestas de unidades de conservação fiscalizadas e administradas por IBAMA e Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMbio). Nessa quinzena 6.880 hectares sumiram da Amazônia, o que equivalente a sete mil campos de futebol. A fonte da informação é o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), portanto uma fonte oficial.
Quanto aos agrotóxicos há duas faces de uma mesma tragédia: a isenção ou incentivo fiscal do governo a empresas que fabricam e comercializam venenos. Trata-se de uma perda bilionária, cujos números exatos ninguém sabe, pois há certas “caixas pretas” na relação entre empresariado e governo, em detrimento do pequeno produtor rural. Os pesticidas têm 60% de isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) e 100% de isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), sem falar na isenção de outros impostos como PIS e COFINS. Em 2016 o defensor público Marcelo Novaes calculou uma perda de R$ 14 bilhões. Evidentemente esse número aumentou muito, já que a liberação de agrotóxicos no atual governo tem batido todos os recordes históricos, com 169 produtos até maio, sendo 48% de alta toxidade e 25% dos mesmos proibidos na União Europeia. O governo começa a isolar o país do comércio com a Europa, conforme manifestações recentes de cientistas europeus.
A outra face da tragédia dessa política irresponsável está na saúde pública e na perda de biodiversidade. Há uma mortandade histórica de abelhas principalmente no sul do país provocada pelo uso de pesticidas. Inúmeras notícias têm circulado sobre isso. A poluição de rios, a contaminação de alimentos e dos próprios agricultores são de amplo conhecimento de órgãos de pesquisa e da imprensa, no país que mais consome agrotóxicos no mundo. As notícias indicam que o brasileiro consome de 5 a 7,5kg de venenos por ano, em média. O governo se comporta como fantoche das grandes empresas e como carrasco da população.