O capitalismo de compadrio (baseado em clientelismo, fisiologismo, propinocracia) é o grande obstáculo da candidatura de Marina Silva e de qualquer outra candidatura baseada na ideia de sustentabilidade.
Esse tipo de capitalismo é produto de formação histórica híbrida entre forças conservadoras, centralizadoras, autocráticas, num espaço territorial em que o Estado se constituiu contra as múltiplas nações indígenas e antes da nacionalidade brasileira, misto de culturas indígenas, africanas e européias.
O capitalismo tem múltiplas formações culturais além de algumas características comuns entre elas. Há fases conhecidas de capitalismo comercial, industrial, assim como fases ou "revoluções industriais" no contexto do capitalismo.
As duas primeiras revoluções industriais no contexto do capitalismo propiciaram organizações conservadoras, centralizadores e autocráticas, ainda que também tenha sido possível uma reinvenção da democracia, ou seja, a democracia representativa, liberal, no contexto dos Estados-nações. É uma reinvenção em relação à democracia grega, da cidade-estado.
Os partidos políticos conhecidos atualmente foram todos formados a partir de ideologias do século XIX, com algumas poucas exceções e modificações. Os partidos tiveram uma fase de crescimento caracterizada pela chamada "modernidade simples" até cerca de meados do século XX. Nessa fase a dualidade entre modernidade e tradição viabilizou a emergência de organizações de classe definidas pelas chamadas revoluções burguesas na Europa. Partidos burgueses versus partidos operários, assim como sindicatos patronais versus sindicatos de trabalhadores, cresceram, entre outras formas organizacionais conservadoras, centralizadoras e autocráticas, ainda que se apresentassem como "partidos revolucionários".
A história mostrou que todos os partidos "revolucionários" transformaram-se em partidos reacionários logo após a tomada do poder governamental. Sem qualquer exceção. O totalitarismo é um fenômeno de partidos de direita tanto quanto de partidos de esquerda.
As forças democráticas, no entanto, tiveram êxitos parciais contra as forças autocráticas após a segunda guerra mundial. Novos desafios surgiram em larga escala para além das fronteiras nacionais, como, por exemplo, os efeitos da poluição e degradação ambiental.
Os partidos verdes ou pró-sustentabilidade emergem como novidade histórica na década de 1970. Nesse contexto a modernidade simples vem sendo superada pela modernidade reflexiva, na qual as tradições e a própria modernidade simples são reinterpretadas, revistas, de maneira crescentemente complexa. A ação local e a ação global se articularm por meio das novas formas de comunicação. As ciências fechadas são desafiadas pela crítica interdisciplinar. As organizações entram em crise à medida que minimizam a subjetividade, a interatividade e a base biofísica ou ecológica.
Fala-se numa terceira revolução industrial a partir da articulação das novas formas de comunicações, das fontes sustentáveis de energia e de uso sustentável de recursos como os transportes. O que é fundamental nessa terceira revolução industrial é a possibilidade de emergência de organizações descentralizantes, inovadoras, mais isonômicas e fenonômicas do que burocráticas. Abre-se com isso um período de crise do sistema capitalista, que não pode, obviamente, ter solução a partir de organizações da modernidade simples, mas que talvez possa ser enfrentada por organizações reflexivas e complexas.
Nessa crise do capitalismo e da modernidade com as inovações da terceira revolução industrial temos novos desafios democráticos -- na realidade a necessidade de reinvenção da democracia, a terceira da história depois da democracia grega e da democracia liberal.
Vejo na candidatura de Marina Silva, certamente muito frágil em termos de estrutura partidária e de recursos financeiros, a possibilidade de enfrentarmos de forma atualizada os desafios civilizatórios no Brasil. (Este texto é claramente apenas um esboço feito para debate, para ser criticado. Desde já agradeço as críticas).